sábado, 18 de abril de 2009

...Ainda João Guimarães Rosa e o seu sertão...

Mais um pouco de Guimarães Rosa...


...
e lá vamos nós acompanhando Riobaldo Tatarana, pelos grotões do sertão, lá onde "cobra desfecha desferido, dá bote...(...) onde ruindade enorme acontecia...(...) onde, sem querer, a gente rosna..."
No oco dos grotões " há coisas medonhas demais..".(... ) e aprende-se que" dor do corpo e dor da idéia marcam forte..."
Mas é lá que também se descobre:
" ...o mais importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas estão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior ."

E ainda:"...só nos olhos das pessoas é que eu procurava o macio interno delas; só nos onde os olhos."

" Vivendo se aprende; mas o que se aprende mais, é só fazer outras maiores perguntas..."

Lá, nas securas nordestinas , Tatarana pode chegar à conclusão:
" Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura."

Qualquer pergunta de Tatarana, ele mesmo a respondia...parece-me que seu interlocutor, eternamente silencioso, estava abismado demais para se manifestar.
...E, em determinado momento, Tatarana , confiando que " qualquer saudade é uma espécie de velhice" , cisma sobre:
" Quando é que a velhice começa surgindo de dentro da mocidade..."

Ele não me perguntou, mas eu me arvoro, por autoridade própria, em responder...

Quando...

É quando a dor se entranha,
se intromete num viver,

cria raiz, sem licença,
não se considera estranha,
resiste de ir embora
sabendo ser, ali, seu porto,
ali seu ponto final?

Ou quando o branco carece
de cobrir todo o cabelo,
nevando sem dó nem pressa,
no domínio do inverno,
que traz seu manto fatal,
desconsiderando a mente,
moendo o lembrar, lentamente?

Quando as rugas se definem,
riscando um mapa ou uma teia,
marcando o rosto tristonho,
cobrando tempos vividos,
lembrando como num sonho,
rios, córregos, riachos,
outrora já percorridos?

Velhice...
Parece-me ser muito mais
que somente estes sinais
que acompanham toda gente.
A velhice chega, sim,
encobrindo a mocidade

...quando o olhar já não faz grude
com o luar...
Quando o coração já não estremece
com o amanhecer...
Quando incomoda o canto do sabiá...
Quando a justiça tanto faz de acontecer...
Quando o amanhã já não traz
o ímã de sonhar...
Quando o olhar já não procura
um outro olhar...
Quando alguém se vê cansado de viver...

Mocidade há
quando ainda se acende o olhar...
Quando a admiração é lei suprema...
Quando as mãos ainda se abrem...
Quando o coração ainda se aquece...
Quando há vontade de cantar...
Quando a fé ainda teima...
Quando o amor ainda floresce...
Quando a criança, em nós, ainda cresce!

...e aí está a minha ousadia em dialogar com o poeta...
Falta somente chamar a atenção para algo muito importante:
...A linguagem, o estilo único e inconfundível de Guimarães Rosa...
Mas isso é um enigma que o leitor tem que desvendar sozinho.
Ler este livro é uma aventura que nos leva a "achar outras verdades muito extraordinárias."

Nenhum comentário: