sexta-feira, 14 de maio de 2010

Eu sou eu e minhas circunstâncias

De volta ao lar antigo.
O endereço em wordpress se negou a corresponder e, como estou fora do meu endereço real, é coerente que use esse "local de encontro", já conhecido, para uma conversa amigável.
Vou passar alguns dias aqui em Ilhéus. Tudo que me diz respeito (com exclusão de boa parte da minha família) ficou em Salvador. Esta situação cria em mim uma razoável "crise de identidade". Afinal, somos ou não somos o resultado daquela conhecida afirmação:"Eu sou eu e minhas circunstâncias" ?(Ortega y Gasset)

A necessidade do autoconhecimento é uma inquietação que nos acompanha desde o berço. Felizmente o avanço por tais veredas não resulta em um saber inteiro e irrefutável. Muito ao contrário. As facetas com as quais nos defrontamos são tantas, que o perfil resultante se apresenta apenas como uma aproximação do real ( se é que ele existe!).

A literatura não pretende dizer que sabe alguma coisa. Mas que sabe de alguma coisa.
Daí, num determinado momento, nos descrevemos sob determinada ótica...Basta que haja uma variação espacial ou temporal, ou psicológica, e o "alguém"que tentamos descrever se reveste de nova "roupagem", e nova "persona" transparece...usando a mesma carteira de identidade. Funções, sentimentos, situações, objetivos, medos e desejos, se destacam como pressões e nos obrigam a retirar, de um velho baú mágico, as máscaras que precisamos e das quais, nem sempre, nos damos conta.

Mas...existem também , momentos de nos depararmos com um cansaço...um desconforto, um reconhecimento da inutilidade de qualquer esforço.

Feito a cebola

Não pintem meu retrato.
Pelo amor de Deus,
não pintem o meu retrato.
Não digam nada de mim.
O que pareço ser, não sou!
Também não sou
o que digo de mim mesmo.
Muito menos o que outros dizem...
Pensando me conhecer
derramam cores sobre o meu fantasma
pensando dali fazer surgir um ser...
Não sou! Não sou esse,
nem aquele que, supostamente,
aparece nas janelas da expressão.
Sou nada além do que ninguém.
Sou menos que a cebola
que, dispensando as capas,
vai vendo surgir o oco.
Sou menos que o camaleão:
sob a mudança de cores
ainda lhe resta uma essência...a mim, não!
Sou menos que o kabuki,
não sou homem nem mulher
...nem personagem...
As roupas, a maquiagem,
o pó-de-arroz, a máscara,
é o mais real que há...
Além disso, uma ilusão,
apenas encenação.
Não me pintem,
não componham um personagem.
Tudo o que venha a ser dito,
nunca revelará o papel que represento,
pois sob ele, o nada!
Tirem-me do palco...é o certo!

Depois das afirmações acima, será possível garantir que voltarei a escrever ? Ou que não voltarei?
Eu digo: a insegurança do terreno em que nos movimentamos, a areia movediça com a qual modelamos o nosso ser, não nos permite garantir NADA !